O trabalho que realizo nas grandes empresas brasileiras realmente tem possibilitado ampliar a minha visão e dos executivos em relação a temas e dilemas cotidianos que ocorrem nas corporações quando o tema é diversidade. É um trabalho de ressignificar o nosso olhar, construindo novas percepções e empresas mais inclusivas.
Na temática LGBT, por exemplo, trago conceitos, informações, análises históricas, vivências pessoais. Enfim, uma gama de informações complexas, traduzidas de forma simplificada, para que os líderes e demais profissionais compreendam a diferença entre sexo biológico, expressão, orientação sexual, identidade de gênero e todas as ramificações da diversidade sexual.
Noto que no decorrer das atividades os profissionais se sentem sensibilizados. Empáticos e proativos. O grande dilema, no entanto, surge na etapa de conclusão do treinamento que propositalmente inclui uma dinâmica com uma história simples, na qual o gestor que está sendo treinado, precisa se colocar na situação delicada e responder o que faria. A etapa é baseada em fatos reais, e enfatiza de forma realista algo que infelizmente muitos profissionais LGBTs continuam passando.
A história da dinâmica é simples. “Paulo (nome fictício), um funcionário homossexual, sentindo-se apoiado pelo Programa de Diversidade, assume para a equipe que é gay. Com base nisso, ele passa a escutar piadas toda vez que vai ao banheiro. Não dizem o nome dele, mas ele sabe que é com ele. E vai procurar você, gestor da área, para relatar o ocorrido.”
O interessante aqui é que por mais evidente que o caso seja, afinal, se 100% das vezes que o Paulo vai ao banheiro escuta piadas, há um comportamento generalizado, direcionado a ele ou não, mas que claramente o atinge.
Esse comportamento expressa LGBTfobia, o que jamais poderia ocorrer em nenhum local da sociedade, muito menos no ambiente de trabalho, regido por leis e normas internas e externas. No entanto, quase sempre o que temos nos treinamentos é uma leva de tentativas querendo justificar a história sem ajudar o Paulo. “Não seria vitimismo? A comunidade gay é muito vitimista”. “Agora não podemos mais brincar?”. “Minha vivência prévia com homossexuais é de que eles são promíscuos”. Respostas reais que tenho escutado nos treinamentos, mas transformado no momento em que conversamos em profundidade e de forma aberta com as lideranças.
Esta reação me possibilita demonstrar de inúmeras formas o quanto a postura LGBTfóbica, coloca em risco o negócio da empresa. E que diversidade não somente é a coisa certa a ser feita, como também blinda a empresa de fragilidades que podem colocar em risco sua imagem, reputação e a sua salubridade financeira.
Veja, na instância interna toda empresa tem um código de conduta e ética assinado por todo profissional que ingressa nos quadros funcionais, com normas antidiscriminatórias claras. E no cenário externo, apesar do desconhecimento do brasileiro médio em relação à legislação, lembro com mais ou menos sutileza que discriminação é crime. E que o profissional que se sente ofendido poderá a qualquer momento buscar caminhos legais.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a discriminação trata-se de: “Toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão“.
Além disso, vale lembrar, que a valorização da diversidade é alavanca para performance e para vantagem competitiva nas empresas, segundo estudos relevantes.
No CEO Legacy, por exemplo, grupo do qual sou consultora consultiva de diversidade, e que é composto por um seleto grupo de CEOs que querem deixar um legado para o país, o tema LGBT+ é um dos focos centrais de nossas conversas. De forma que presidentes de empresas desse grupo têm se tornando diretamente sponsors e padrinhos da diversidade acompanhando de perto os avanços dentro da empresa para que possam contribuir e assegurar que casos como do Paulo, mencionado aqui, e outros milhares deixem de acontecer nas empresas.
O trabalho que estes CEOs estão assumindo é o de garantir que todos os profissionais terão igual oportunidade de trabalhar, performar e crescer na empresa, sem ter que lidar com barreiras impostas a outros profissionais na sua jornada.
Neste sentido, o que eu tenho co-construído são estratégias como os próprios treinamentos que garantem cada vez mais que os profissionais LGBT+ alcancem novos patamares em suas carreiras. Este é um movimento sem volta rumo a novos lugares, onde o que define o crescimento do profissional não serão mais barreiras e piadas impostas por colegas, mas, sim, o que cada um pode e quer chegar.
Fonte: Época